Miss Dayse, conduzindo

“Conduzindo Miss Dayse” foi o ganhador do Oscar de melhor filme em 1990. Na época, o nome de Martin Luther King começava a ganhar força para além dos ambientes apenas religiosos, o mundo começava a reconhecer o líder decisivo para a história dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos. De forma sensível, com muita arte e competência nas interpretações, os atores principais, Morgan Freeman e Jessica Tandy, deram vida para um chofer negro que trabalhava para uma uma senhora branca, onde de forma poética a relação entre um negro e uma branca judia foi desenvolvida com profundidade, beleza e ética. Com maestria, o cinema contribuía para um tema até hoje tão caro para a boa convivência global. Bons tempos quando o nível da arte era “outro nível”…

Na terça que passou, 13/12/16, parte do Brasil acompanhou a final do Master Chef na TV Bandeirantes. Agora, outra Dayse surgiu em cena. Diferentemente do filme, não conduzimos, fomos conduzidos por ela. A Dayse era a concorrente improvável, aquela que todos os demais concorrentes consideravam a mais fraca, sem a menor capacidade de chegar a final, e isso declarado abertamente sem o menor constrangimento. Quando se tratava de competir contra a Dayse, seja qual fosse a etapa do reality, o clima para os seus opositores era sempre o de “já ganhou”. Ou seja, respeito zero por uma adversária que certamente não estava ali por mero acaso.

E como exatamente a Miss Dayse do Master Chef foi conduzindo a audiência do programa? Com humor, leveza, humildade, empenho, esforço, conhecimento no uso dos temperos e, segundo os três chefs que julgam os pratos, muito sabor. Estes ingredientes somados as qualidades e características naturais que a Dayse tem, proporcionaram um resultado na tela que agradou a maioria. Os jurados, únicos que experimentam os pratos que os candidatos fazem, precisam ser conquistados essencialmente pelo sabor. Nós, no entanto, precisamos de outros ingredientes, e a Dayse sobrou quando o assunto foi humildade e simpatia. Essas combinações fizeram dela a preferida pela esmagadora maioria.

Eis que então entra em cena os temas que se tentou explorar na final, feminismo e machismo. De fato, era um tanto irritante ver os homens do programa desdenhando dela enquanto candidata com condições de chegar a final. Também não foi nenhum pouco decente a brincadeira desnecessária de um já eliminado na final quando soltou um “vai gordinha”. Também não faltaram discursos exaltando o fato dela ser uma mulher que estava vencendo etapa a etapa num ambiente dominado por homens. Tudo isso é verdade. E tudo isso é sim importante que seja criticado e combatido. Mas daí a levantar bandeiras se aproveitando do sucesso de um programa, é querer forçar demais.

Foi nesse clima que tentaram conduzir Dayse, até mesmo na entrevista ao vivo no jornal da noite da emissora o entrevistador tentou arrancar dela alguma declaração mais polêmica. Nada, ninguém conseguiu. Miss Dayse continuou conduzindo. Como? Com sua simplicidade e autenticidade. De forma clara e direta ela definiu que não é nem feminista e nem machista. Apenas encara as lutas da vida com naturalidade, aprendendo com quedas, ofensas e pressão. Ou seja, deixou no vácuo todos que tentaram pegar carona na exposição que a vitória conferiu a ela.

Mas não foi apenas isso. Dayse frequenta a igreja Metodista e, ao ganhar, ao vivo em rede nacional, portanto sem chances de cortes ou edições, dedicou três vezes a vitória à Ele. A família registrou a emoção com “glórias e aleluias”, enfim, o momento era dela e ela honrou Aquele que esteve o tempo todo com ela. De novo, era a Miss Dayse conduzindo a final e não os protocolos da final conduzindo a ela. Foi lindo. Mostrou-se uma pessoa livre na sua fé, de bem com a própria vida, grata por sua conquista, alguém, enfim, que conduz a própria história sem dramas, traumas, complexos ou deslumbramentos desnecessários, tão somente se reconhece como filha de um Pai amoroso, generoso e sempre presente.

Desencanada que só, não poderia perder a oportunidade, ao vivo lembrou que também quer um marido. Conduziu de novo. Desta vez não se intimidou de conduzir frente as câmeras as carências afetivas do próprio coração. Enfim, a Dayse nos lembrou que a vida deve ser simples, complicar pra quê? A felicidade pode estar num sabor, num sorriso, numa fé autêntica, num jeito correto de competir, numa confiança serena quando quase ninguém mais acredita no potencial da gente.

Não deu para conduzir Miss Dayse dessa vez. Foi Miss Dayse quem conduziu. E conduziu sem ter a pretensão de conduzir. Apenas foi ela mesma, confiou no Deus que conduz a história, nunca deixou de crer que Ele exalta humilhados, vivenciou nos limites do jogo a suficiente graça dEle, entendeu que quando fraca, nEle ela era forte. Enfim, a chef Dayse foi para nós uma atual e inspiradora metáfora, trazendo frescor num mundo tão mal conduzido por políticos e formadores de opinião em geral, concluiu sua saga mostrando que com Ele, para Ele e por Ele podemos e devemos conduzir com segurança os passos da nossa vida.

Paz!

Por: Pr. Edmilson Mendes

 

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