Você é tóxico?

A gente já leu sobre tóxicos na natureza, na saúde, já discutimos muito sobre relacionamentos tóxicos e sobre o uso deste para bombas e armas químicas. O fato é que esta palavra foi escolhida como a “Palavra do Ano 2018” pelo respeitável e renomado dicionário Oxford, da língua inglesa. Pois é, ele que já escolheu “selfie, fofo, e ?” agora definiu esta palavra que em inglês tem o sentido de envenenamento, veneno, algo que contamina mesmo. Como jornalista e escritora eu confesso que sempre fico esperando qual será a palavra do ano, pois não deixa de ser uma percepção de vários especialistas sobre como foi o ano que passou.

Caramba, e que ano tóxico! 2018 acenou com crises humanitárias ao redor do globo ao mesmo tempo que viu sistemas e governos flertarem com o facismo na maior cara lavada provocando gastrite nos estômagos mas sensíveis, como o meu. Foi ano de eleições aqui no Brasil, motivo para muitas pessoas se desconectarem, inclusive em família, por não conseguirem dialogar sobre suas diferenças. Ao contrário, se feriam e envenenavam a relação. Tóxico!

Mas o que me aguçou a curiosidade mesmo foi a explicação dos especialistas e as associações que eles fazem para chegar na palavra e eles explicaram que esta escolha se deve ao aumento em 45% das buscas pelo termo no dicionário, o que fez com pensassem em eleger “masculinidade tóxica” como vencedora, uma vez que masculinidade foi a segunda mais buscada na associação com tóxico. Todavia, os pesquisadores resolveram deixar só a palavra vencedora pela abrangência.

Se pensarmos que no lugar de tóxico quase que “incel” ganhou, palavra polêmica que na língua inglesa é a abreviação de “celibatária involuntário” e descreve os homens que odeiam as mulheres porque não querem transar com eles, tem algo de muito pobre no reino da Dinamarca, ou no reino das relações, parafraseando o príncipe Hamlet para manter tudo no país de Shakespeare.

O movimento #metoo encabeçado pelas atrizes de Hollywood com certeza contribuiu para este despertar de intolerância à violência sofrida por nós mulheres há tantos anos e em tantos ambientes. Se fala mais de feminicídio, as escolas falam mais de igualdade, as igrejas convocam seus fiéis pelo amor e cuidado mútuo e talvez por tanta vitrine, mais se saiba de casos intoleráveis. Minha questão, no entanto, é o quanto isto me afeta. E você? Porque quando eu deixo que o ambiente, as frustrações e a toxicidade aí fora afete quem eu sou, meu modo de agir e de me relacionar eu me torno parte disso.

Nem chegamos à metade do primeiro mês do ano ainda, mas queria te convidar a pensar comigo em como você pode carregar o selo de tóxico na testa. Na maneira de tratar quem está próximo, quem está longe, quem discorda, quem é diferente, quem é de outra “tribo”. No jeito de responder uma agressão, seja ela de que nível for, na maneira de tratar os filhos, o chefe, o colega, na maneira de simplesmente passar adiante o veneno que recebeu… como é contigo? Não quero que “tóxico” seja uma palavra que associem a mim no final deste ano, nem a mim nem aos meus, mas se eu não me mover na direção contrária, a minha “química natural” pode me levar a isso e a você também. Afinal, hoje, que palavra te define?

Fonte: Fabiana Bertotti

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